Governo analisa propostas para substituir o fator previdenciário, prestes a ser derrubado. De qualquer modo, trabalhador só receberá benefício integral se tiver anos extras de contribuição
O brasileiro vai ser induzido a se aposentar mais tarde para compensar as perdas com a arrecadação em função do fim do fator previdenciário, prestes a ser derrubado no Congresso. Entre as propostas analisadas pelo governo, está o congelamento da tabela do fator previdenciário e a mudança na forma de cálculo do fator, que seria substituído pelo fator 95/85. Nos dois casos, o segurado terá de trabalhar por mais tempo para receber o benefício integral.
“Não adianta aprovar a extinção pura e simples do fator previdenciário, porque o presidente Lula já avisou que vai vetar. Nas novas propostas, o trabalhador cede um pouco e o governo dá uma amenizada no fator previdenciário”, afirma Leonardo Rangel, coordenador de previdência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vinculado ao Ministério do Planejamento. Pelos cálculos do instituto, com o fator 95/85 o homem terá de trabalhar três anos a mais do que hoje, inteirando 38 anos de contribuição, em vez dos atuais 35, para ter direito à aposentadoria integral. Para a mulher, serão dois anos a mais, chegando a 32 anos de contribuição (hoje o mínimo é de 30 anos).
O outro substitutivo que está sendo costurado pelo deputado Pepe Vargas (PT-RS), relator do projeto que acaba com o fator previdenciário, estabelece que a tabela do fator previdenciário seja congelada no momento em que o trabalhador atinge a idade mínima para se aposentar. Para o segurado, essa proposta é menos vantajosa do que a primeira, pois obriga o homem a contribuir seis anos a mais com a Previdência e a mulher, a acrescentar oito anos na conta.
Na quinta-feira passada, o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS), da mesma base de Pepe Vargas, disse que o governo foi “convencido” pelo debate e defende agora o fim do fator previdenciário. Segundo ele, a base aliada trabalha junto à equipe econômica para criar outra forma de calcular o benefício dos aposentados, como por exemplo o fator 95/85. Ele entraria no lugar do fator previdenciário, cuja extinção é defendida exaustivamente pelo senador petista Paulo Paim, que levanta a bandeira a favor dos aposentados.
Na prática, Pepe Vargas, eleito ontem novo vice-líder do PT na Câmara, está negociando com o governo a substituição do atual fator pelo fator 95/85, que consiste no direito de se aposentar quando a soma da idade com o tempo de contribuição resultar em 85 para as mulheres ou 95 para os homens.
Atualmente, o brasileiro se aposenta com a idade média de 54 anos e 35 de contribuição. Ele pode se aposentar de imediato, mas terá um corte de 30% no valor integral de sua aposentadoria. Para atingir a aposentadoria integral, teria que continuar trabalhando e contribuindo com a Previdência até os 61 anos de idade e 38 de contribuição.
Com o fator 95/85, se esse mesmo brasileiro médio contribuir até os 57 anos, completando 38 de contribuição, poderá se aposentar com o benefício integral. Com isso, terá um ganho de 17% no valor da sua aposentadoria. “O novo cálculo torna a aposentadoria mais atraente em termos de valores. Se o segurado trabalhar três anos a mais, poderá melhorar em até 17% o seu benefício”, diz Rangel. Na fórmula antiga do fator, ele só conseguiria ter o benefício integral trabalhando sete anos a mais, o que desestimulava a maioria dos trabalhadores a deixar para se aposentar mais tarde. “O pedágio diminui”, completa.
"Fiquei sabendo que o governo iria aumentar o tempo de contribuição e corri para me aposentar" - Mário Tavares, aposentado desde 1995, com 33 anos de contribuiçãoAo criar o fator previdenciário, em 1999, a ideia não era reduzir o valor das aposentadorias, mas incentivar os trabalhadores a ficar mais tempo na ativa. No entanto, como os brasileiros entram muito cedo no mercado de trabalho, eles não abriram mão de se aposentar precocemente. Como a idade média com que os brasileiros se aposentam ficou estabilizada em 53 anos, o fator previdenciário operou na outra variável: cortou o valor das aposentadorias. É o caso, por exemplo, do aposentado de Belo Horizonte Mário Tavares. Ele se aposentou em 1995, com apenas 33 anos de contribuição previdenciária. “Fiquei sabendo que o governo iria aumentar o tempo de contribuição e corri para me aposentar. Não só eu, mas muita gente naquela época”, conta.