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Previdência (II): a pressão do salário mínimo




Damos continuidade hoje à série de quatro artigos sobre questões previdenciárias, desenvolvendo aspectos específicos do tema, sem entrar na polêmica das propostas em si, mas apenas com o intuito de informar ao leitor a respeito da evolução de alguns componentes do gasto do INSS, para subsidiar o debate acerca da questão. Em nosso encontro anterior, explicamos as razões e a importância do tratamento do tema e, nos próximos dois artigos, abordaremos a evolução dos benefícios por tempo de contribuição e o aumento do número de aposentadorias femininas. O tema de hoje é a pressão cada vez maior das despesas indexadas ao salário mínimo (SM) no universo do gasto do INSS e do Tesouro (Lei Orgânica da Assistência Social-LOAS e Rendas Mensais Vitalícias-RMV).

Por cálculos que não há espaço aqui para detalhar, calculamos o peso das despesas com benefícios iguais a um SM ao longo dos últimos 10 anos, entre 1999 e 2009, adotando uma boa estimativa para o ano em curso:

O impacto foi considerável, com o gasto vinculado às despesas do INSS e LOAS/RMV com SM - correspondente ao piso previdenciário e assistencial - aumentando em 1,3 % do PIB em 10 anos. Registre-se que essa variação é bastante mais do que se espera que o governo central invista este ano, o que significa que, se aquele fenômeno não tivesse ocorrido, a despesa do Tesouro com investimento poderia mais do que dobrar.

O cidadão comum, compreensivelmente, apoia a política de aumentos reais do SM, por entender que esta é uma política que beneficia as pessoas mais pobres da população. Na verdade, porém, no caso dos que recebem benefícios previdenciários ou assistenciais, esse é um pressuposto que não corresponde à realidade. A tabela - feita há alguns meses a pedido por Samuel Franco, programador da equipe de Ricardo Paes de Barros, do Ipea- indica como se distribuem, na escala distributiva, aqueles que recebem benefícios do INSS ou LOAS/RMV. Ela mostra que apenas 11% das pessoas que recebem tais benefícios se situam entre os 30% mais pobres da população. Mais ainda: nada menos que 66% dos beneficiados por essa indexação se localizam nos 50% de maior renda. Pense-se na situação de uma mulher aposentada pelo INSS, que recolhia como autônoma no valor de um SM e que vive com o marido, comerciante e com uma renda líquida mensal de aproximadamente R$ 3.500 por mês. É evidente que a família não é rica. O fato, porém, é que com essa renda per capita da ordem de R$ 2 mil por mês, ela está muito longe de ser uma família pobre e, apesar disso, é beneficiada pela política de valorização do SM.

O fenômeno do aumento do SM foi muito importante desde a estabilização da economia. Mesmo sem considerar o salto que a variável deu em 1995 - quando, em termos reais, aumentou 43%, de R$ 70 para R$ 100, quando a inflação era da ordem de 20% - entre setembro - mês da Pnad - de 1995 e o mesmo mês de 2007, o SM teve um crescimento real de 66%. Registre-se que nesse período de 12 anos, o rendimento médio mensal captado pelo IBGE teve uma queda real de 5% (ver gráfico). Em outras palavras, enquanto que a renda real da população até mesmo diminuiu na comparação entre esses dois pontos, o rendimento médio dos aposentados e pensionistas que recebem um benefício de um SM teve um incremento de 2/3 do seu valor-base de 1995.

O efeito disso sobre as contas do INSS é expressivo. Mesmo quando se isola e se retira o impacto sobre o LOAS - que desde o final da década passada cabe ao Tesouro e não mais à Previdência Social - e se leva em conta apenas o universo dos aposentados e pensionistas, como dois de cada três entre eles recebem um SM e este teve aumentos significativos, o peso dessas aposentadorias e pensões no total da despesa com aposentadorias e pensões passou de 33% no começo da década, para mais de 40% do total atualmente. Em outras palavras, um aumento de 5% do SM gera um incremento de 2% na folha do INSS, que se soma ao crescimento do número de aposentados - da ordem de 4% ao ano.

Quanto tempo mais o país irá manter a política de aumentos do piso previdenciário? Os políticos têm a palavra. Este ano e no próximo, o SM e o piso previdenciário, em termos reais, estarão aumentando mais de 5% ao ano. É óbvio que essa é uma decisão que já está tomada e deve ser cumprida. Na próxima década, porém, se o SM continuar a crescer nessa velocidade, a despesa do INSS cresceria em torno de 6,0% todos os anos. Se o PIB crescer 4,5% ao ano, o gasto do INSS, que em 2010 deverá ser da ordem de 7,5% do PIB, alcançaria 8,6% do PIB 10 anos depois. Lembremos que o investimento do governo é hoje de 1% do PIB. O país pode não fazer nada. O risco, nesse caso, é que em 2020 não sobre nada para investir. O próximo presidente terá provavelmente que propor algo a esse respeito.

Fabio Giambiagi, economista, co-organizador do livro "Brasil Globalizado" (Editora Campus), escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: fgiambia@terra.com.br.


Fabio Giambiagi
06/04/2009

Fonte/Autor: Valor Econômico.




    

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