Valor Econômico
Dispostos a fortalecer o Bolsa Família no ano eleitoral de 2022, governo e Congresso chegaram a um acordo que limitará a cerca de R$ 40 bilhões o pagamento do “meteoro” dos precatórios incluído sob o teto de gastos e aceleraram a tramitação da proposta.
O desenho, antecipado ontem pelo Valor Pro, foi discutido em reunião com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Economia, Paulo Guedes, mas enfrenta resistências no Congresso.
Os R$ 40 bilhões correspondem ao que foi pago em precatórios no ano de 2016, quando foi criado o teto de gastos, corrigido pela inflação. Entrariam aí as sentenças de pequeno valor.
Mas, como o “meteoro” de sentenças judiciais a pagar em 2022 é de R$ 89 bilhões, faltaria um saldo de R$ 50 bilhões. Esses poderiam ser quitados também no ano que vem, mas de outras formas, disse Pacheco: encontro de contas com entes públicos ou privados, compensações com ativos da União ou por negociação entre as partes.
Pacheco não detalhou esses instrumentos, mas na área econômica discute-se, por exemplo, confrontar os precatórios a serem pagos para os Estados com as dívidas que eles têm junto ao Tesouro Nacional; permitir que os créditos de precatórios sejam utilizados para pagar dívidas tributárias; e aceitar precatórios em seu valor de face como moeda de privatização ou na compra de imóveis da União, por exemplo.
Haveria o estímulo para adesão dos contribuintes porque,do contrário, a quitação poderia demorar mais.
Esses instrumentos que serão criados pela Proposta de Emenda Constitucional (PEC) permitiriam, segundo Pacheco, quitar parte das dívidas judiciais sem ocupar espaço no teto, por não se tratarem de gastos. O que não for possível pagar com o uso desses recursos ficaria para 2023, disse.
Guedes, Pacheco e Lira afirmaram que houve consenso de que a solução para os precatórios precisará atender a três conceitos: honrar o pagamento dessas dívidas, respeitar o teto de gastos e criar espaço fiscal para fortalecer o Bolsa Família, rebatizado como Auxílio Brasil. A solução discutida ontem atenderia a esses três pontos, defenderam.
Essa proposta, contudo, enfrenta resistências na Câmara. “Votei a favor da admissibilidade na Comissão de Constituição e Justiça, mas no mérito voto contra. Não concordo com postergar os pagamentos”, disse o deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE). “Furar o teto não é mais discussão, é decisão do governo. A discussão é se fazem isso de forma transparente ou disfarçada”, disse o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), que propôs retirar os precatórios do teto, pagar com emissão de dívida e recalculá-lo sem esse gasto.
Apesar das resistências, os líderes partidários acertaram com Lira acelerar a PEC dos Precatórios. Ele criou a comissão especial ontem, eles indicaram os representantes em menos de três horas e a instalação ocorrerá hoje, às 10h, com a eleição do presidente do grupo. O líder do Republicanos, Hugo Motta (PB), deve ser o relator. Serão marcadas sessões de plenário nas segundas-feiras e sextas-feiras, com o objetivo de antecipar a conclusão do prazo mínimo de dez sessões para a comissão votar a PEC. Com isso, o colegiado poderá aprovar o parecer no começo de outubro.
A pressa ocorre porque o Auxílio Brasil, uma reformulação do Bolsa Família, depende dessa PEC. Lira frisou que também é importante que o Senado aprove a reforma do Imposto de Renda, que cria uma fonte permanente de recursos para o programa de transferência de renda a partir da tributação sobre distribuição de dividendos.
O Auxílio Brasil começará a ser pago em novembro, destacou ontem o ministro da Cidadania, João Roma. Em audiência na comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, ele disse que o programa social é uma política de Estado e que governo e Congresso devem buscar formas de viabilizá-lo e chegar a um acordo nos precatórios. O auxílio emergencial acaba em outubro.
Para o presidente da Comissão Especial de Precatórios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Eduardo Gouvêa, as premissas apresentadas ontem dão base para construir uma solução e evoluem em relação à proposta original do governo, mas o sinal dado por Pacheco de que parte dos pagamentos devidos em 2022 pode ficar para 2023 acende um alerta.