Valor Econômico
A Advocacia-Geral da União (AGU) trabalha com o cenário de que as despesas do governo federal com precatório devem atingir o pico de R$ 89,1 bilhões no ano que vem para, em seguida, ter uma ligeira desaceleração e chegar em 2024 no patamar de 2020, em valores corrigidos. No ano passado, esse gasto foi de cerca de R$ 50 bilhões.
Na avaliação de técnicos da AGU, a “esperança” da equipe econômica é que a curva de precatórios caia com o tempo para que se tenha espaço no teto de gasto para aumentar o volume de pagamentos e, com isso evitar, uma tendência perigosa do estoque a pagar.
Leonardo Ribeiro, analista do Senado e especialista em contas públicas, considera “muito difícil haver redução espontânea dos gastos com precatórios”. “Governo terá que promover conciliações de conta e acordos com deságio de 40% com base nos dispositivos que foram aprovados pela PEC dos Precatórios. O resultado dessas ações vai depender de muitos fatores”, afirmou. Para Ribeiro, covid-19, digitalização da Justiça e medidas de ajuste fiscal na área dos gastos sociais são fatores que podem pressionar o gasto com precatórios daqui para frente.
O ministro Paulo Guedes (Economia) tem dito que o país será atingido por um “meteoro fiscal” de quase R$ 90 bilhões em precatórios no próximo ano. A PEC que permite o pagamento parcelado desse débito foi a solução encontrada pela União para lidar com o problema e garantir o pagamento de R$ 400 de Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família, em ano eleitoral.
A União paga seus credores de processos judiciais por meio dos precatórios, que lhe dão previsibilidade e permitem o pagamento por ordem cronológica. Quem obtém trânsito em julgado contra a União até o meio do ano tem o valor inscrito em precatório e pago no ano seguinte. Se for no segundo semestre, a União tem mais um ano para pagar, para que ela tenha previsibilidade.
Mesmo com os parcelamentos, a expectativa, pelo menos da AGU, é de que não haja acúmulo de pagamento de precatórios derivados de benefícios previdenciários, cujo valor das ações normalmente é inferior a R$ 600 mil e devem ser pagos integralmente. Se confirmado o cenário de desaceleração das derrotas do governo na Justiça, a expectativa é que o estoque dos precatórios não tenha uma trajetória insustentável. Em outubro, esse estoque era de R$ 94 bilhões, mais do que o dobro do que era computado em dezembro de 2017 (R$ 41,8 bilhões).
Segundo técnicos da AGU, não há previsão nos riscos fiscais (em que estão previstas todas as ações contra a União com a probabilidade de vitória ou não) de “esqueleto” que possa provocar uma mudança na trajetória de curto prazo. Pelo menos é o que se evidencia no momento. A AGU ainda reforçou que, ao contrário do que Guedes afirmou, não há surpresa no tamanho dos precatórios a serem pagos em 2022 e o Ministério da Economia foi alertado disso.
A possibilidade de derrota do governo estava contemplada nos riscos fiscais, porém o que é difícil dizer é quando efetivamente se tornará um precatório. Esse é o caso do Fundef, em que a União foi condenada a pagar R$ 16,2 bilhões aos Estados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas. Ou seja, segundo técnicos da AGU, “não houve desconhecimento” com relação ao ações relacionadas ao Fundef ou ao setor sucroalcooleiro.
De março para julho deste ano, o risco fiscal dos processos judiciais saltou de R$ 3,776 trilhões para R$ 4,921 trilhões. Esse aumento se deve a inclusão de perda “possível” de R$ 166 bilhão relacionado a um processo de arbitragem. Do total, R$ 926 bilhões eram classificados como riscos prováveis em julho ante R$ 692 bilhões em março.
Segundo o painel de precatórios da AGU, que não inclui passivos previdenciários, em outubro, havia 144 mil precatórios requisitados que juntos totalizavam o gasto de R$ 43,72 bilhões a serem pagos em 2022. Entre os destaques, estão o precatório de R$ 2,672 bilhões da Petrobras e o de R$ 1,854 bilhões para a Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar). Pela PEC aprovada, precatórios nesse montante teria o pagamento parcelado. Para técnicos da AGU, a PEC pode promover uma mudança de comportamento pois alguns vão negociar o recebimento do recurso com deságio para ter acesso ao dinheiro mais rápido.
Para Ribeiro, o analista do Senado, a avaliação da AGU sobre a trajetória dos precatórios precisa ser tratada com toda a transparência possível.
Ele ainda defendeu a aprovação do PLP 144 que tramita no Senado. “O projeto aprimora o anexo de riscos fiscais da LDO para que os precatórios sejam especificamente avaliados juntamente com metodologia de apuração de riscos e impactos no financiamento das políticas públicas. Por que os precatórios atingiriam o pico e voltariam a cair? Esse tipo de questão deve estar muito bem analisada nos relatórios oficiais do governo. Quais são as ações que serão tomadas para reduzir o estoque de precatórios? Olhando para os números, há uma tendência de crescimento das despesas com precatórios nos últimos anos”, destacou o especialista em contas públicas.
Ribeiro defendeu ainda a criação de um programa de compensações de débitos com precatórios seguindo a experiência dos governos estaduais e municipais.
A PEC dos Precatórios, promulgada na semana passada pelo Congresso, criou um limite para o pagamento de precatórios - o valor quitado em 2016 corrigido pela inflação. O valor, de R$ 44,5 bilhões em 2022, será o máximo que o Executivo honrará de precatórios dentro do Orçamento. O total de dívidas judiciais que deveriam ser quitadas no ano que vem é de R$ 89 bilhões. Assim, metade dos títulos ficará para ser paga no ano seguinte - quando novos precatórios também entrarão na conta.
Dentro desse limite, têm prioridade de pagamento requisições de pequeno valor (RPV, até 60 salários mínimos), além de precatórios alimentares com “superpreferência”, de idosos, pessoas com deficiência e portadores de doenças graves e que tenham valor de até três vezes os RPVs.