Metrópoles
Com as presidências da Câmara, do Senado e das mais importantes comissões ocupadas por aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o funcionalismo público teme que a agenda da reforma administrativa — proposta que muda a realidade da categoria — avance sem ajustes e negociações com os servidores.
Além da proximidade com o Palácio do Planalto, o temor é ancorado também na origem dos deputados e senadores que ocuparam esses postos: o Centrão — conjunto de partidos que não possuem uma orientação ideológica específica e que comumente negociam diretamente privilégios com o governo federal, como cargos e liberação de emendas.
Duas propostas de emenda constitucional (PECs) são motivo de preocupação. A PEC Emergencial nº 186, de 2019, prevê a redução temporária de 25% da jornada laboral e salário de servidores em períodos de crise financeira. Já a PEC nº 32, de 2020, chamada de reforma administrativa, mexe na forma de contratação, na remuneração e no desligamento de pessoal.
Agora, com as eleições no Congresso resolvidas, os alvos dos servidores serão Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG). A atuação deles é imprescindível para a tramitação das matérias.
Em entrevista ao Metrópoles, Alberto Ledur, coordenador executivo da Federação Nacional dos Trabalhadores dos Ministérios Públicos Estaduais (Fenamp) e representante do Movimento a Serviço do Brasil, grupo que defende os interesses do funcionalismo, ponderou sobre a atuação do Congresso sobre o tema.
“A nossa intenção é mostrar para a sociedade o impacto das mudança, por exemplo, no atendimento na ponta. Cortar jornada e salário de servidores significa, na prática, menos médicos, enfermeiros, professores”, explica.
Alberto defende que a discussão das matérias tenha espaço para os diversos pontos de vista. “Queremos um ambiente em que possamos apresentar outras perspectivas”, destaca.
Ele avalia, contudo, que a postura da presidência da Câmara mudará com a saída do ex-presidente da Casa Rodrigo Maia (DEM -RJ). “O Maia tinha uma tendência de atender os anseios do mercado, que necessariamente não são os nossos. Teremos agora uma perspectiva mais clientelista, de troca de favores”, ataca.
Um dos principais pontos criticados pelo movimento, e que deve pautar as discussões, é a flexibilização de contração em cargos comissionados e a estabilidade.
“No Centrão, existe a cultura de pedir cargos. Imagina como isso será com uma possível ampliação de cargos em comissão, de confiança? Se aprovada como está [a reforma administrativa], comissionados poderão ocupar cargos além de direção e assessoramento, isso passará a ser permitido para cargos técnicos”, explica.
A mudança na estabilidade, mecanismo que dificulta demissões no serviço público, é vista pelo grupo como uma ameaça. “Temos que discutir a situação dos servidores que trabalham com investigação, com fiscalização fazendária, por exemplo”, cita.
Críticas a Guedes
O ministro da Economia, Paulo Guedes, defende que o salário de servidores seja diminuído e atribui à categoria privilégios que não são praticados no mercado privado.
A postura é alvo de críticas. “É lamentável que tenhamos um ministro que pense que o servidor é o problema. Somos parte da construção da solução, inclusive para a recuperação após a pandemia”, afirma.
Agora, com aliados de Bolsonaro no comando do Congresso, avaliam os representantes dos servidores, Guedes não terá mais o argumento de que o parlamento trava a agenda de reformas. Com isso, a tendência, segundo os fucnionários, é de que haja uma aceleração da pauta.
“O ministro fala que o servidor público ganha muito e tem privilégios, mas a reforma que ele propõe não ajusta distorções que envolvem juízes ou promotores nem combate os supersalários”, salienta.
O Movimento a Serviço do Brasil é formado por 30 entidades, presentes em todas as unidades da federação, e representam mais de 400 mil servidores de carreiras administrativas do Judiciário, Ministério Público e fiscais tributários estaduais e distritais.
O Brasil tem cerca de 12 milhões de funcionários públicos nos níveis federal, estaduais e municipais. Somente a União, por exemplo, tem 600 mil empregados ativos. Caso sejam aprovadas, as mudanças deverão ter efeito escalonado.