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Uma investigação sobre as possíveis causas da judicialização de benefícios previdenciários e assistenciais no Brasil apontou que problemas de coordenação do próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), além do descompasso entre as perícias feitas pelo órgão e as realizadas pelo Judiciário, estão entre os principais motivos que levam ao grande número de processos em tramitação.
Esse panorama, destacado no relatório "A judicialização de benefícios previdenciários e assistenciais", foi apresentado na última terça-feira (20/10), durante a 320ª sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento trata das causas, problemas e políticas públicas indicadas como soluções.
Encomendado pelo CNJ, o estudo foi elaborado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) na 4ª Edição da Série Justiça Pesquisa. O tema "Previdência Social e benefícios assistenciais" é o mais judicializado em varas e tribunais federais (representa mais da metade dos novos casos ajuizados), sendo relevante também na justiça estadual, por competência delegada, bem como no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O estudo também revelou que intensidade e o perfil da judicialização da previdência estão relacionados às condições socioeconômicas locais, como nível de renda e desenvolvimento do mercado formal de trabalho. Além disso, a redução do quadro de pessoal técnico e de procuradores do INSS, conforme a pesquisa, está associada ao aumento do tempo médio de análise de benefícios e à judicialização pela demora da autarquia em responder às solicitações dos segurados.
Números
No total, foram utilizados dados de 9.253.045 processos administrativos e 593.772 concessões em decorrência de decisão judicial, do período entre dezembro de 2018 e dezembro de 2019, assim como dados administrativos agregados para os dez anos anteriores; dados de gestão processual da justiça de 9.027.825 processos judiciais entre 2015 a 2019; textos de decisões judiciais referentes a 1.334.814 processos entre 2015 a 2018; e entrevistas semiestruturadas com 47 representantes dos sistemas de justiça e previdenciário.
A partir da análise dos processos administrativos, o relatório aponta seis características principais das concessões e indeferimentos:
— ao menos 11% dos benefícios concedidos pelo INSS advêm de decisões judiciais, especialmente de ações do sul e sudeste;
— há prevalência da requisição administrativa e judicial de auxílio-doença em tema que envolve a validade e o alcance das perícias médicas e divergência entre a administração pública e o Judiciário sobre o conceito de invalidez;
— a maior parte dos indeferimentos administrativos se dá por divergência entre o pedido e o parecer da perícia médica;
— a participação dos benefícios que requerem perícia é maior entre as concessões por decisão judicial em comparação às decisões administrativas indicando maior propensão à judicialização;
— a proporção de pessoas desempregadas é consideravelmente maior nos casos de indeferimento;
— nos últimos dez anos, observou-se aumento no tempo médio de análise dos benefícios por parte do INSS.
Já a análise dos processos judiciais, a partir dos dados da Base Nacional de Dados Processuais do Poder Judiciário (DataJud) do CNJ, indicou algumas conclusões:
— o aumento na distribuição de processos relativos a Previdência e benefícios assistenciais;
— concentração das ações na justiça federal (as regiões do TRF-4 e TRF-5 são as com maior carga de processos e o TRF3 é a região com a menor intensidade de judicialização e a que mais proporcionalmente indefere pedidos;
— tos benefícios assistenciais, aposentadoria rural e salário maternidade são mais frequentes nas regiões do TRF-1 e TRF-5.
Políticas públicas
A partir dos dados coletados, o relatório elenca quatro macroproblemas identificados na pesquisa. São eles: dificuldade de acesso à instância administrativa para requerer o benefício; dificuldade de internalização da jurisprudência pelo INSS; subaproveitamento na via administrativa; e o subaproveitamento das informações apuradas no processo administrativo em sede judicial.
Como resultado da análise das informações e das entrevistas, o relatório indica 16 ações destinadas a resolver ou minimizar os macroproblemas e reduzir a judicialização. Por exemplo, extinção do atendimento preferencial de advogados na instância administrativa; acesso presencial às agências do INSS em regiões de maior exclusão digital; adoção de uma política de informação sobre o uso da plataforma "Meu INSS"; maior acesso e simplificação do processo administrativo, com ampla informação ao segurado; transição para o processo digital com atenção à qualidade das análises; e mais informações ao segurado sobre o andamento das análises administrativas.
Também foi indicado reforço na qualidade de análise do material probatório e verificação de informações sobre o segurado; uniformização dos critérios de análise probatória e pericial; compartilhamento de sistemas do INSS e do Judiciário; acesso pelo Judiciário às análises e documentos do processo administrativo; ampliação dos esforços do Judiciário para a consolidação dos enunciados.
Ao apresentar as conclusões do estudo, o relatório alerta para o risco de a epidemia de Covid-19 agravar a situação da judicialização dos benefícios previdenciários e assistenciais. A partir das informações, a equipe de pesquisa do Insper considerou que a ampliação da demanda pelos benefícios previdenciários e assistenciais, dificuldades de coordenação entre as esferas administrativa e judicial, o desemprego em níveis mais altos e o constrangimento fiscal devem contribuir para a intensificar a judicialização. "É momento, portanto, para iniciativas que visem mitigar esse problema", recomendam os pesquisadores. Com informações da assessoria do CNJ.