Valor Econômico
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou a interlocutores que a reforma administrativa ficará na gaveta até ocorrer mobilização dos setores interessados em aprová-la: o governo, que não estaria tão interessado por causa do desgaste em ano pré-eleitoral, e o mercado, que fez duras críticas ao parecer votado pela comissão especial e teria deixado de lado a proposta, na visão do deputado.
Por outro lado, sindicatos estão em atuação constante para pressionar os deputados a votarem contra o projeto. Essa mobilização já fez com que muitos dentro da base aliada do governo se comprometessem com a rejeição do texto, inclusive dentro do PSL, sigla onde estão os aliados mais “ideológicos” do presidente Jair Bolsonaro.
O projeto saiu com grandes resistências na comissão especial porque juízes e promotores do MP foram excluídos, com o argumento de que era inconstitucional tratar dessas categorias por iniciativa legislativa - a proposta de alteração nas carreiras, segunda essa visão, deveria partir do Judiciário. No plenário, o discurso é de que a emenda para incluir juízes e promotores terá grande apoio, mas que sua aprovação pode aumentar resistências no Senado ou levar a maiores chance de judicialização.
“Ficou forte o argumento de que a reforma bate nos pequenos e alivia para a elite, quando, na verdade, não bate em ninguém porque só vale para os novos”, disse um parlamentar influente.
Pelo texto, todos os cortes de “privilégios”, como férias superiores a 30 dias, só valerão para quem entrar no serviço público após a promulgação da emenda constitucional. Com isso, não haverá nenhuma economia de recursos a curto prazo com a PEC.
Além disso, outro ponto que azedou o apoio do mercado foi a incorporação na reforma de mudanças nas regras previdenciárias e pensões de policiais, após pressões da bancada da bala. Com isso, as forças de segurança pública, além de preservadas das mudanças, ganhariam benefícios a partir da aprovação. Parte dos economistas passou a defender que uma reforma como essas só seja tratada em 2023.
Na comissão especial, partidos aliados apontaram a falta de articulação do governo e identificaram grandes resistências entre os partidos da base. Legendas como PL, Republicanos, PSD, MDB e PSDB tiveram que trocar seus representantes por outros do Novo para garantir votos a favor da reforma. A sigla super liberal na economia tem só oito deputados em toda a Câmara, mas acabou com sete deputados na comissão.
Havia a expectativa entre os integrantes da comissão de que o próprio Lira assumisse as articulações para aprovar o texto em plenário, mas ele tem dito a interlocutores que a iniciativa de construir maioria no plenário tem que partir do governo e que o mercado precisa defender o projeto - o que não ocorreu. Por ser uma proposta de emenda constitucional (PEC), é preciso o voto favorável de 308 dos 513 deputados.
A reforma foi aprovada pela comissão há três semanas, mas Lira praticamente não fez reuniões sobre o tema desde então e preferiu direcionar o foco da Câmara para outros temas mais urgentes e de apelo popular: diminuir o preço da gasolina e do diesel e solucionar o impasse em torno dos precatórios (dívidas judiciais), que se não for resolvido impedirá a criação de um novo programa social. Segundo aliados, a reforma ficará na gaveta, a espera de um momento mais adequado - provavelmente, só depois da eleição de 2022.